Quando a conheci estava tão
triste que não pude perceber. Ela apareceu com aquele sorriso branco, me
prometendo que tudo ficaria melhor, e, realmente, isso aconteceu. Saímos
juntas, badalamos, rimos e brindamos, como se já nos conhecêssemos há anos.
Ela era tão boa para mim que
cheguei, inclusive, a brigar com meus amigos. Estava cega e encantada com sua
presença. Toda vez que estava com ela, me sentia viva. Toda vez que nos
encontrávamos era divertimento na certa. Ria como se não houvesse o amanhã. Mas
o amanhã sempre vinha e com ele a ausência dela. Então aquele vazio perturbador
voltava e eu ficava pior do que eu estava antes de conhecê-la.
Os dias eram longos e
depressivos e custavam a passar. Eu chorava por motivos que eu desconhecia.
Tudo era triste e vazio. A vida não tinha mais graça. Foi assim que decidi
fazer dela minha parceira! Aonde eu ia leva-a comigo e tudo começou a ficar bem
novamente. Ela apresentou-me para seus amigos, que, assim como eu, também a
admiravam e necessitavam da sua presença.
Em consequência desse novo
circulo social fui deixando meus antigos, e verdadeiros, amigos. Estava sempre
ocupada com ela, sempre tínhamos algo divertido para fazer ou algum lugar
badalado para ir. Ela era demais! Tudo o que eu queria ser, eu era quando
estava com ela. Tudo o que eu imaginava que era impossível se tornava possível
com sua presença.
Além de ela fazer-me sentir
viva, fazia-me sentir capaz e o mundo se tornava melhor. Ah, como ela era boa
para mim! Mas ela tomava todo meu tempo e sugava todas minhas energias. Comecei
a não cumprir minhas obrigações, queria sempre mais divertimento ao seu lado, e
foi quando tudo começou a piorar.
Ao perceber isso tentei me
afastar, mas quanto mais eu tentava, mais ela sorria para mim, mais ela tinha a
me oferecer. E essa oferta de prazer fazia com que sua ausência se tornasse
terrivelmente insuportável ao ponto de quase enlouquecer. Antes disso
acreditava que ela precisasse de mim, mas descobri que na verdade era eu quem
precisava dela...
Então, em um dia comum, logo
depois de sua partida, fechei os olhos, ainda eufórica pela sua presença, e,
como num sonho, vi um anjo. Perguntei a ele sua opinião sobre minha amiga. Ele
me disse que também fora amigo dela outrora, e descreveu a sensação que sentia
com a sua presença como se fosse eu quem estivesse falando. Mas ele me
acrescentou um porém, nas entrelinhas me contou como ela era traidora, como
esse sentimento bom era avassalador e destrutivo. Como eu me tornava outra
pessoa quando estava com ela.
Durante alguns minutos
fiquei estática. Não queria aceitar, mas observando bem de perto, vi que tudo
era verdade. Ela não era minha amiga, ela era minha inimiga, a tristeza que eu
sentia na sua ausência era o que sua presença causava. Ela mostrava um mundo de
mentiras e ilusão que ia embora junto com ela. Mas era tão convidativo que não
pude perceber sozinha.
Agradeci ao anjo e abri os
olhos. Ao fazer isso, com muita relutância, decidi me afastar. Sem dar nenhuma
satisfação e nem sequer um adeus. Não me conformava como pude ser tão burra
durante tanto tempo. Como pude me deixar enganar pelo sorriso. Imaginava que
não poderia viver sem ela.
Mas sobrevivi e me libertei.
O mundo não ficou mais fácil, mas era verdadeiro. Ao perceber isso ficava com
nojo só de ouvir seu nome ou sentir seu cheiro. Fiquei com raiva de encontrá-la
novamente se aproveitando de pessoas que se encontravam na mesma situação que
eu antes de conhecê-la.
Infelizmente todos têm a
oportunidade de se tornar seu amigo, ela não é muito seleta. E pior ainda, nem
todos conversam com um anjo que já a tenha conhecido e, às vezes, quando
encontram, não dão ouvidos a ele. Realmente ela é perigosa e fatal. E temo
pelos que cruzam seu caminho.
Mas se quiser evitar passar
por perdas, não queira conhecê-la. Seu nome é Cocaína, ela parece agradável no
começo, mas só te arrastará. Isso é certo. Se quiser evitar passar por perdas,
não queira conhecê-la. Não se deixe enganar pelo sorriso.